perfil
Rui Barata é um homem que espalha sorrisos. Ficou cego aos 18 anos, mas soube contornar as dificuldades de uma vida de escuridão
Rui Barata é um homem que espalha sorrisos. Ficou cego aos 18 anos, mas soube contornar as dificuldades de uma vida de escuridão
O telefone toca, Rui Barata pára imediatamente de teclar na sua máquina de escrever Braille e levanta o auscultador: “Escola Superior de Educação, bom dia!”. Há três anos, Rui chegou à Escola Superior de Educação de Coimbra para trabalhar como telefonista. Nasceu em 1959, numa aldeia da Covilhã, onde viveu até aos 22 anos na companhia dos pais e dos dois irmãos. Uma infância serena. “ Faço mais traquinices agora do que fazia na minha infância”, diz Rui com um sorriso malandro. Mas não deixou de aproveitar a sua juventude. “A minha mãe conta muitas vezes que um dia me apanhou a dormir na banheira, depois de ter andado a beber jeropiga com os amigos”, diz a sorrir. “Aquilo era doce!”.
A escola nunca foi uma prioridade para si e, por isso, abandonou-a muito cedo. Mais tarde, começou a trabalhar num café da aldeia até aos 18 anos, altura em que a cegueira o surpreendeu. “Não aceitou bem a cegueira”, diz Lurdes Cardoso, esposa de Rui. “Ele tinha esperança que as novas tecnologias lhe permitissem ver”. Não permitiram, mas não foi esse incidente que lhe tirou a boa-disposição e a vontade de viver. Esteve em Lisboa, onde aprendeu Braille na Fundação Raquel e Martin Sain. Foi depois para o Porto e, em 1994, escolheu a cidade de Coimbra para viver. A cidade do Choupal deslumbrou-o e foi enquanto frequentava o curso de telefonista na ACAPO que conheceu Lurdes, a sua esposa, também invisual.
“Gosta de fazer as coisas sozinho e tem um óptimo sentido de orientação”, diz Lurdes. Rui não gosta de ser tratado de forma diferente e tenta ser o mais autónomo possível. Por vezes, isso não é fácil devido às dificuldades que encontra na rua, e a ajuda dos outros torna-se essencial. Indignado, Rui sublinha, por exemplo, como é constrangedor ter de mandar parar todos os autocarros para saber qual é o que tem de apanhar. Em 1993, pôde constatar uma realidade bem diferente, em Zurique, na Suiça. “Não havia coisas em cima dos passeios”, o que torna a circulação muito mais fácil.
Consciente de que as oportunidades ainda não são iguais para todos, Rui refere que a ajuda de instituições, e no seu caso do Centro de Emprego, são fundamentais para que os deficientes se consigam integrar no mundo do trabalho.
“É muito prestável, sempre pronto a ajudar, conta anedotas e anima-me quando estou triste”, afirma a colega de trabalho, Maria Abrantes. A sua boa-disposição é notória quando diz que gosta de estar à conversa com os amigos, de preferência em redor de uma mesa recheada, “para ir petiscando”. Feijoada e cozido à portuguesa são dos seus pratos favoritos, que sabem ainda melhor quando “acompanhados com um tintol”. “Relaciona-se muito bem com as pessoas, mais com aquelas que vêem do que com cegos”, explica a esposa. “Não desprezo os cegos, mas muitos cegos juntos é uma grande confusão. Começam a apalpar-se uns outros, para saber quem são”, diz Rui em tom de brincadeira.
Para além de estar com os amigos, gosta também de ouvir música e de cantarolar. Não é raro ver Rui cantar todo o CD de José Cid, um dos seus cantores favoritos. Vaidoso, simpático, teimoso e brincalhão, Rui Barata é um bom exemplo de alguém que encara a vida com um sorriso, apesar das dificuldades. Grupo 1
Um comentário:
Conseguíram dar a conhecer uma das pessoas que mais curiosidade suscita na ESEC. Os meus parabéns.
Postar um comentário